O Chega é, hoje, indistinguível da figura do seu líder. André Ventura é inequivocamente o principal activo do jovem partido e tem sido um factor chave para a sua afirmação. Mas Ventura é também o principal passivo do CH e poderá ser uma barreira ao seu crescimento futuro. Importa tentar compreender porquê.

A trajectória do CH desde 2019 representa um notável caso de sucesso no sistema partidário português. Não só conseguiu pela primeira vez representação parlamentar para um partido situado no espaço da direita radical (algo inédito em mais de quatro décadas de democracia em Portugal) como, desde que entrou na Assembleia da República, a tendência tem sido de claro crescimento. Embora falhando por margem substancial o objectivo de forçar Marcelo a uma segunda volta, e ficando ligeiramente atrás de Ana Gomes, as eleições presidenciais confirmaram o valor eleitoral de André Ventura, abrindo caminho também para os bons resultados do CH nas autárquicas e, principalmente, nas legislativas de 2022.

O crescimento rápido do CH e a sua afirmação como terceiro partido nacional não podem ser analisados sem ter em conta a crise do PSD e também o alinhamento com as tendências internacionais (e em particular europeias) de consolidação da direita radical (veja-se ainda recentemente o caso das eleições suecas). Mas, ainda assim, a importância pessoal do líder do CH não deve ser desvalorizada, até porque nunca ninguém em Portugal tinha conseguido o que Ventura conseguiu.

Com o PS (compreensivelmente) interessado em bipolarizar o mais possível com o CH e com Augusto Santos Silva a usar a confrontação com André Ventura como instrumento para se tentar posicionar como possível candidato nas próximas presidenciais, as condições deverão continuar a ser favoráveis ao CH. Mas se Ventura é inequivocamente o principal activo do CH, a forma como o partido está estruturado em torno da sua figura e absolutamente dependente do líder limita também seriamente o potencial de crescimento do partido.

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Apesar do importante papel intelectual e estratégico desempenhado desde o início por Diogo Pacheco de Amorim e da emergência de algumas figuras promissoras como a deputada Rita Matias, o CH continua a ser, no essencial, um partido unipessoal centrado em torno do seu líder. Pior: um partido unipessoal com indícios muito pouco saudáveis de culto de personalidade. Esta é uma limitação particularmente significativa no caso do CH porque, ao contrário de outros partidos europeus de direita radical, o partido nasceu e cresceu asssente numa personalidade mediática e não num movimento de base ou em correntes ideológicas ou intelectuais pré-existentes.

Importa aqui recordar que o mediatismo, carisma e capacidade oratória do líder são muito importantes mas não chegam. Tanto a Nova Democracia (com Manuel Monteiro) como o Aliança (com Santana Lopes) fracassaram apesar de terem lideranças carismáticas e bem conhecidas do eleitorado. O sucesso do CH é inseparável do sucesso de Ventura mas não se esgota nele. Ventura foi a personalidade certa no lugar certo no momento certo (de crise do centro-direita tradicional e espaço para a direita radical) e é esta combinação de factores que explica o rápido crescimento do partido.

Mas, para continuar a crescer, Ventura precisará de fazer o que, até agora, se revelou incapaz de concretizar: atrair e cultivar quadros e consolidar uma base programática com ideias e propostas minimamente consistentes. Ora, pelos sinais dados ao longo dos últimos meses é, no mínimo, duvidoso que tal venha a acontecer. Se não conseguir ser mais do que um tribuno e orador dotado a bradar contra o sistema de forma oportunista, Ventura estará condenado a ser apenas uma espécie de versão mais polida de Marinho Pinto e o CH muito provavelmente não resistirá à decadência do líder. O CH não existe sem Ventura mas para ter futuro precisará de existir também para além de Ventura. Pelo que foi possível observar até agora, não é certo que tal seja possível.